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sexta-feira, 3 de setembro de 2010

VIOLÊNCIA NO CORPO E NA MENTE



Violência no corpo e na mente - Diálogo com Wagner Rama.
Este artigo de Wagner Rama compõe o livro, Adolescência pelos caminhos da violência (1998), organizado por Lévisky. O livro é fruto dos trabalhos apresentados no II Encontro Adolescência e Violência: conseqüências da realidade brasileira, realizado em 1996.
Wagner Rama é médico pediatra, psicoterapeuta infantil, pesquisador e docente na área da psicossomática psicanalítica da criança e do adolescente. Seu artigo interessa-nos sobremaneira por trazer a questão do corpo em relação conjunta com a doença orgânica e os processos subjetivos do indivíduo. E mais, como o corpo é violentado até mesmo pelas práticas médicas quando não o encaramos em sua completude (corpo biológico, físico, psíquico, emocional...)
De acordo com o autor, a violência está presente em vários acontecimentos que se dão de forma explícitas e visíveis como, por exemplo, os acidentes, os homicídios, suicídios, brigas, etc; e acontecimentos cujas formas são mais subjetivas, como a violência da discriminação, do preconceito, da exclusão social, chegando até a violência mais sutil, em que inserimos a violência pulsional, expressa por meio dos distúrbios psicossomáticos ou outros transtornos mentais.
Citando Chauí (1982): “existe violência quando um indivíduo ou instituição, através de meios físicos ou psíquicos, impede a manifestação de outro indivíduo na sua singularidade”. Ou seja, a violência é, então, a negação de um sujeito pelo outro, portanto, seria um impedimento ou mesmo uma restrição à manifestação da subjetividade singular de cada sujeito.
Pensando assim, colocamos a violência também num terreno subjetivo, de relações autoritárias e psicossociais, incluindo, principalmente, aspectos políticos e ideológicos, da falta de respeito à diversidade, pluralidade, características fundamentais do ser humano – ou animal humano como quer Wilheim Reich!
A psicossomática psicanalítica tem como conceito fundamental que as somatizações, que podem implicar toda doença orgânica, são vazias de significado na medida em que o significado nos remete ao recalcado, seus substitutos e suas metáforas. Neste sentido, para o autor, o modelo teórico dos mecanismos psíquicos implicados nas neuroses não pode ser transposto para o entendimento dos fenômenos psicossomáticos; por isto, é preciso lançar mão de outros conceitos da metapsicologia, pois não podemos mais deixar de pensar as doenças sem integrá-las no campo da subjetividade e do sujeito.
O modelo biomédico muitas vezes não concebe o indivíduo em sua singularidade, subjetividade e desejos, bem como nega a existência de um inconsciente e sua importância na constituição do sujeito. Com a super especialização da medicina, que privilegia sua sofisticação tecnológica, há um lado bom que é bem vindo; mas há, em contrapartida, uma violência na atividade clínica. Esta violência se refere à negação do indivíduo como um todo; às práticas institucionais com o doente mental; às formas de atendimento ao parto; às crianças hospitalizadas; à falta de compromisso com o aleitamento materno; ou seja, pelo fato de, muitas vezes, ver o ser humano apenas a partir do enfoque biológico: “Não é à toa que hoje vivemos uma verdadeira disseminação de práticas alternativas para a solução de problemas de padecimento humano, para os quais a medicina não tem resposta, não se preocupa ou aborda de forma inadequada, por se fazer cega (ou surda) às questões do sujeito” (RAMA, 1998, p. 66).
Em relação à psicossomática, parece que há um consenso de que o fenômeno psicossomático deve ser separado dos processos neuróticos e psicóticos, colocando a questão do vazio. Isto é, este fenômeno seria uma disfunção do corpo biológico em conseqüência de uma falha na organização pulsional da ordem da falha na inscrição representativa. O aparelho psíquico implica a doença orgânica por não trazer para o terreno das representações as excitações que tem origem no corpo ou no mundo externo. Por isto, o fenômeno psicossomático é resultado de uma falha na inscrição pulsional, colocando-se no limite do impensável, no limite do mental com o somático. Neste sentido, um paciente propenso a somatizar possui estruturas congeladas, esvaziadas de substância e de significação.
De acordo com o autor, a escola francesa de psicossomática associa as somatizações com a depressão essencial e com a neurose de comportamento; senda esta última caracterizada pela pobreza representativa, pela agressividade, impulsividade, ligação ao real e ao atual, ausência de sonhos, lapsos e atos falhos.
A questão da somatização é tão séria que pode ser equiparada, pelo fato de existir uma estrutura comum ou semelhante entre eles, às drogadições, aos comportamentos de risco, à neurose de comportamento, havendo casos de concomitância ou alternância entre essas formações patológicas.
Tais estruturas se assemelham inclusive em relação à origem, “a origem das estruturas com tendências às somatizações (e outras correlatas) estão nos traumas ocorridos nos dois primeiros anos de vida e nas características das relações objetais nestas etapas primitivas” (RAMA, 1998, p. 68).
A tendência à somatização está relacionada à insuficiência nos processos de organização pulsional e aponta três tipos básicos de desarmonia nas relações objetais, que se relacionam às seguintes tendências:
1. Caracterização pela privação. O filho de mãe depressiva, ausente ou deslibidinizada. Grande parte dos casos brasileiros.
2. Caracterização pela instabilidade e inconstância. O filho de mãe impulsiva, agressiva, que vivencia a violência nas relações parentais.
3. Caracterização da mãe que é só presença. O filho não vivencia a ausência ou a falta. A função paterna é ausente e não se organiza a castração.
Além disso, a psicossomática aponta a questão do trauma real como desencadeador de angústia e desafia a estrutura do sujeito, que no caso do somatizador tenderia a deslocar para o somático a pressão pulsional.
Nosso contexto coopera para isto tudo na medida em que há uma proliferação de uma estética marcada pela excitação da violência; na produção científica, um domínio dos métodos cartesianos; etc. Na maioria das esferas da vida e do conhecimento humano, vivemos a hegemonia da ação sobre a reflexão, e a velocidade das satisfações eliminou a vivência da falta. O resultado disto é um empobrecimento da subjetividade imaginária.
Lógico que a desigualdade social e econômica é um pano de fundo muito perverso para este contexto, desembocando em duas realidades perniciosas: a daqueles que tudo têm e a daqueles que nada têm. Os meios de comunicação mostram um mundo onde se tem tudo e na realidade o sujeito não tem nada.
Nas palavras do autor: “Defendo o ponto de vista de que os extremos se tocam, assim os filhos da carência e os filhos da abastança, no que diz respeito à violência são muito semelhantes [...] as coisas fundamentais devem ser apenas suficientemente boas, pois a ausência e a falta vivenciadas em grau suficiente estão na base de uma organização psíquica com boas possibilidades de adaptações às inevitáveis dificuldades da vida, para as quais a criatividade humana ainda é a melhor alternativa contra a violência” (p. 73).
E com esta indicação, encerramos nosso breve diálogo com o Professor: como trazer a criatividade para nossa vida sem que ela fique apenas como um conceito abstrato? Como evitar as somatizações? Como reconhecer a violência e combatê-la? A violência que às vezes é sutil ou aquela que estamos acostumados e nem mais a percebemos como tal.
Acreditamos que essa reflexão não pode nunca se limitar a este texto!

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